Renovados e conectados

A evolução do e-commerce mudou o olhar das empresas nas relações comerciais e trouxe o desafio de investir em canais virtuais para dinamizar as vendas no varejo

por Rúbia Evangelinellis

Diante de um consumidor conectado, exigente, que compara preços e marcas, e sai de casa sabendo o valor do produto e onde encontrar as promoções (isso quando não faz compras pela internet), as empresas que atuam na cadeia de abastecimento investem em tecnologia como estratégia para dinamizar as relações comerciais e se plugar à cabeça do brasileiro e ao moderno mundo dos negócios virtuais. 

Nesse caminho, especialistas, empresários e executivos destacam a importância das plataformas digitais, como o e-commerce e a marketplace, que abrem o leque de opções de canais de vendas, sejam eles o B&B (compra e venda entre empresas) ou o B&C (transação comercial entre empresas e consumidores, ou de empresa para consumidor).

Para Sillas Souza César, professor de Economia da FAAP – Faculdade Armando Alvares Penteado, é essencial avaliar primeiramente o panorama de consumo levando-se em consideração dois aspectos, que são de cunho conjuntural (com impacto no curto prazo) e estrutural. Neste último, percebe-se a evolução do canal digital como alternativa para alavancar os negócios.

“A internet chegou com vigor no mundo a partir das décadas de 1990 e de 2000, desenvolvendo diversos serviços, sendo que o e-commerce, a partir de 2010, ganhou força. Ocorre que a geração nascida no fim da década de 1990 está consolidada no mercado de trabalho e acostumada a comprar pela internet ou, pelo menos, a pesquisar preços pelos meios eletrônicos.”

A partir disso, acrescenta, é possível observar o desenvolvimento do sistema, o surgimento de sites modernos, como a Amazon e as Americanas, que se constituem em uma rede de fornecedores disputando o consumidor, modelo de negócios que vai praticamente dominar as relações de mercado dentro e fora do Brasil. Para o economista, o País está bem inserido nesse processo, com uma potencialidade de consumidores conectados à internet e com o aperfeiçoamento dos modelos de e-commerce. 

“Do ponto de vista da oferta, eu entendo que as empresas estão atentas a esse movimento, que retrata a compra consciente do consumidor e tem possibilitado, aqui e no exterior, reduzir a pressão inflacionária sobre os preços dos produtos.”

 

Renato Meirelles, presidente do Instituto Locomotiva

SEM BLÁ-BLÁ-BLÁ

Renato Meirelles, presidente do Instituto Locomotiva, também acredita que está claro que a tecnologia empodera o consumidor, desde a pesquisa e a obtenção de informações sobre novas marcas, passando pela compra, até a reclamação sobre produtos e serviços, e a economia de tempo. Mas, por outro lado, acrescenta, a sequência de anos de crise econômica serviu para consolidar novidades nesta década que se inicia, amadurecendo o comportamento de compra. 

“Uma dessas novidades, reflexo da racionalização do consumo, é o fato de que o brasileiro está menos tolerante ao blá-blá-blá sobre marcas que não entregam a diferença de performance, em especial para os itens adquiridos regularmente nos mercados.”

Em consequência dessa conduta, Meirelles acredita que, quando o consumidor entra no pequeno varejo, vai comprar o que estiver à sua disposição nas gôndolas. “Aí, a distribuição desempenha um papel-chave no abastecimento, e o gerenciamento por categorias passa a impor um desafio ainda maior.

O distribuidor terá de oferecer um negócio que ponha à disposição de quem compra três diferentes opções de preço, com entrega parecida com a da marca líder, as quais terão de se reinventar, investir em inovações e mudar as embalagens.”

As compras por aplicativos também provocam alterações no hábito de frequentar um ou outro estabelecimento e acirra a disputa no canal digital. 

“É uma mudança estrutural no relacionamento com o cliente, especialmente dos hipermercados (com as escolhas feitas pela internet). Creio que seja esse o momento de o varejo de bairro crescer, graças à comodidade que oferece às compras. E também de o atacado distribuidor fazer a ponte e levar ao varejo de vizinhança toda a experiência que a indústria tem.”

Aliás, Meirelles acredita que esse movimento do atacado, de adotar o e-commerce, é oportuno para estabelecer um elo mais estreito na cadeia.

INICIATIVAS NO ATACADO

Os grupos Martins, Vila Nova e Apoio Mineiro/Dec Minas estão no time de empresas do setor que investem no e-commerce. Os três exemplos servem para mostrar a necessidade de treinamento contínuo para aprimorar o canal de vendas, como um bebê que cresce pequeno, engatinha, e precisa de apoio para dar os primeiros passos até conseguir caminhar com firmeza.

Flávio Martins, CEO do Grupo Martins, empresa com capilaridade para atender o mercado nacional, explica que o foco do modelo de marketplace adotado pela companhia destina-se a expandir o atendimento para as empresas. 

“É um canal por cujo intermédio aproximo quem quer comprar de quem quer vender, e viabilizo a negociação por meio de crédito, logística, conhecimento e tecnologia.”

No site, segundo informou, os negócios são viabilizados com seus cerca de 600 fornecedores, além de 80 a 90 empresas com ofertas de produtos, algumas delas até concorrentes. 

“São bem-vindas ao nosso marketplace, que ganha poder. Entendo que a pior coisa é não atender os clientes que estão lá, que eu conheço, e sei do que precisam em um determinado momento, e nós não conseguimos suprir essa falta.”

De 2017 para cá, o marketplace do Martins já representa 25% do faturamento do Grupo. Em 2020, deverá somar um volume de negócios entre 1,2 e 1,3 bilhão de reais, montante que faz frente a um faturamento projetado de 5,6 bilhões de reais. 

Flávio Martins deixa claro que se trata de uma ferramenta para aumentar o bolo geral de negócios, que é para onde mira quando fala de perspectivas. Em 2019, o Martins vendeu para 215 mil clientes distintos. Em 2020, a meta é alcançar de 230 a 240 mil clientes.

 

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FLÁVIO MARTINS, CEO do Grupo Martins

“A proposta não é fazer o marketplace crescer isoladamente nem trocar o canal de vendas, mas simchegar a um resultado global com esse canal e com as vendas presenciais.”

Segundo informou, os representantes comerciais autônomos são estimulados a lançar mão do marketplace para expandir sua base de clientes.

 “Eles podem ensinar o cliente a fazer a compra eletrônica, motivá-lo, e assim reduzir a necessidade de visitas frequentes”, destaca. Pelo sistema eletrônico, o Martins adota uma logística que varia caso a caso, dependendo da negociação.

LIÇÕES JÁ APRENDIDAS

 

O Grupo Vila Nova também reconhece no e-commerce uma ferramenta de apoio para vendas, um canal complementar para estimular as relações comerciais estabelecidas com empresas-clientes (B2B). A iniciativa partiu de Leonardo Severini e Alexandre Villas Boas, diretores da empresa, há três anos. Para eles, a fase atual não é a de contabilizar os ganhos, mas sim a de investir na busca de melhorias contínuas. 

“Estamos aquém de ter uma operação que esteja desempenhando bem. E ainda fazendo tentativa e erro, aprendendo. No campo virtual, as mudanças estão cada vez mais aceleradas e espero, em dois anos, medir o tamanho e todo o montante de investimento necessário.” Nessa fase de melhorar o conjunto da obra, algumas lições já foram aprendidas.

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LEONARDO SEVERINI, diretor do Grupo Vila Nova

“O e-commerce deve ser visto como um instrumento de vendas que oferece uma boa prestação de serviços, firmada com o comprometimento de prazos tratados e de informações prestadas.”

Mesmo porque, assegura, é um sistema de vendas complementar, robotizado, que não tem o apelo do contato direto com os clientes, como fazem os seus 400 RCAs. Leonardo Severini explica que, para harmonizar, ou melhor, acomodar e abrir espaço para o e-commerce, sem preterir o trabalho dos representantes comerciais, considera importante equiparar os preços entre os canais.

Outra iniciativa consiste em garantir uma contrapartida (em remuneração) ao RCA, que terá de adotar o perfil de hunter, ou seja, ser caçador e cadastrador de clientes. “O profissional que tratava de dez clientes no passado, passa a atender 50, com menos tempo destinado a cada um. Mas, como apoio, terá respostas mais rápidas, e mais tecnologia”, explica.

A partir desse novo desenho de atendimento, o Grupo Vila Nova possibilita o aumento da carteira. Hoje, ele atendeSão Paulo e Minas Gerais em quatro áreas geográficas: Sul, Grande BH (Belo Horizonte), Zona da Mata e Centro-Oeste. Nessa fase inicial, o e-commerce representa algo em torno de 10% das vendas, mas já alcançou picos de 13%. 

Outros canais são o teleatendimento e a venda de campo, sendo que os RCAs respondem por quase 90% da comercialização. “Acredito em todas as formas de venda, e que o trabalho do RCA nunca vai acabar, mas também acredito que o canal digital vai manter a empresa atualizada, próxima dos anseios do fornecedor e do varejo.” A parte mais delicada é a de manter uma boa sintonia com a área de vendas e de fazer com que os varejistas também encampem o canal virtual de compras.

“Vejo que muitos têm relação umbilical,de confiança, com o RCA e aguardam o sinal verde do nosso representante, que atua como consultor, para acessar o e-commerce.” O Grupo Vila Nova está abrindo parceria com outras empresas que querem anunciar no e-commerce. Atualmente, a equipe de análise do e-commerce conta com dez pessoas. Pelo sistema, o Grupo comercializa todo o portfólio, de 3.500 itens.

INVESTIMENTO ESSENCIAL

A partir da premissa de que investir no comércio virtual é essencial, e isso vale para diferentes modelos do setor atacadista, as lojas de autosserviço do Apoio Mineiro também têm e-commerce. 

Prestes a completar 18 anos em maio próximo, a rede de 18 lojas, instalada na Grande Belo Horizonte, investe em um modelo digital híbrido, B&B e B&C, que completa no mesmo mês dois anos de vida. O faturamento com e-commerce responde por 3,5% do faturamento da divisão Apoio Mineiro. A previsão é de crescimento de 5% a 6% até 2023. 

Rodolfo Nejm, vice-presidente do Grupo Super Nosso (que agrega o ApoioMineiro), considera que, em um mercado cada vez mais competitivo, exigente e de margens cada vez menores, é fundamental buscar a eficiência necessária nas relações comerciais estabelecidas na cadeia de abastecimento, da indústria ao varejo, para chegar ao consumidor.

E reconhece o e-commerce (B&B) como um facilitador, com os fornecedores possibilitando ao intermediário – os comerciantes – o acesso aos produtos, lançamentos e calendário, independentemente da visita de um vendedor.

“Somos parceiros de grandes indústrias, como P&G, Unilever, Colgate, Ambev, Coca, Diageo e Mondelez, e já estamos, há algum tempo, fazendo esse trabalho. Temos boa parte dos clientes comprando via e-commerce. E, como resultado dessa melhor sinergia, o comerciante entende, em um tempo menor, a estratégia relativa ao produto, isto é, a ação do fornecedor. O sistema B&B promove a otimização dos processos, da produtividade e da interação”, explica.

A partir dessa abordagem em que todas as partes ganham, Rodolfo Nejm explica que o e-commerce, batizado de Apoio Entrega, atende todo o Estado de Minas Gerais, tanto para os comerciantes (foco principal do autosserviço) como para os consumidores. 

Das entregas efetuadas, 65% são para o varejo, que conta com promoções específicas das indústrias apenas nesse canal. Oferece um portfólio de aproximadamente 14 mil itens – menos os perecíveis – maior que aquele encontrado nas lojas (com sortimento de 8 mil itens). As mercadorias saem do centro de distribuição e são entregues por transportadores contratados.

Rodolfo Nejm, vicepresidente do Grupo Super Nosso

“Assim, conseguimos fidelizar clientes. Entregamos um sortimento com variedades e promoções, além de atender comerciantes de outras regiões.”

Nejm adianta que parcerias estão sendo estabelecidas para encorpar o Apoio Entrega, expandindo o marketplace em 2021. Outra novidade é o projeto de e-commerce para o e-commerce do Dec Minas, distribuidor exclusivo de cosméticos, exclusivo para B2B.

NEUROCIÊNCIA

A necessidade de levar em consideração a própria cabeça do consumidor, tendo uma percepção mais aguçada dos critérios que ele adota para tomar decisões e investir em uma linha de produtos adequada ao que procura, faz com a P&G invista na neurociência para desvendar esses mistérios. Segundo André Felicíssimo, vice-presidente de Vendas da empresa, o estudo mostra que mais de 90% das decisões são automáticas.

Considerando que o organismo do ser humano é programado para economizar energia, o cérebro, um dos órgãos que mais consomem calorias, cria maneiras automáticas de tomar decisões, poupando esforços. O avanço da tecnologia, acrescenta, reduzirá ainda mais o esforço na tomada de decisões. 

“Temos de continuar estudando como influenciar as decisões do consumidor. E entender que a gôndola fala com o shopper. Quando ele entra na loja, se não encontrar xampu, condicionador e produtos de tratamento, não pensa em levar o conjunto”, avalia.

No atual contexto de automação, o executivo destaca a importância de se adotar estratégias de vendas que vão além do diferencial de preços e que possam aperfeiçoar a dinâmica da prestação de serviços. “O distribuidor precisa oferecer ao varejista o que ele precisa, apontar qual será o próximo passo para o desenvolvimento da categoria, e mostrar o que a vizinhança busca e vende.” 

No que tange ao impacto da tecnologia nos negócios B&B, Felicíssimo é da opinião de que o atacado distribuidor tem, sim, de desenvolver um sistema de atendimento virtual, como site e aplicativo, mas que funcione mais para seu aprendizado e facilitador de atendimento, com carreira solo. 

Levando em conta que se trata de uma ferramenta que, para ser potencializada, requer investimentos vigorosos, ele reconhece que a tendência aponta para o desenvolvimento de grandes conglomerados, atuando como marketplace, nos quais o pequeno varejo vai procurar esse atacado distribuidor.

DICAS DE ESPECIALISTAS

Especialistas orientam as empresas para que, antes de investir no e-commerce, definam seus objetivos e preparem o terreno para operar com um sistema. Kai Philipp Schoppen, CEO e fundador da Infracommerce, explica que a ferramenta exige uma complexidade tecnológica muito maior e apresenta desafios aos atacadistas, que já trabalham bem com múltiplos canais de vendas, mas ainda precisam desenvolver expertise para o comércio digital.

“A natureza desse novo canal é diferente e baseia-se em três pontos: demanda por um trabalho com tecnologia muito elaborada; desenvolvimento de um sistema de inteligência artificial e de business intelligence (coleta de grande volume de dados, dia e noite, e organização, compartilhamento e monitoramento de informações ; e reconhecimento de que a logística é um diferencial estratégico, sem considerá-la como centro de custo.”

Para ele, a Amazon é um exemplo de eficiência na entrega, que mantém uma “obsessão” de melhorar os processos a cada dia e de fazer a entrega cada vez mais rapidamente. Além do alto investimento em tecnologia, automação e modernização, acrescenta, é essencial acompanhar as tendências da ciência. E um dos caminhos para a empresa se manter atualizada é estabelecer um acordo de cooperação com faculdades.

“Percebo que 95% das pessoas ainda têm uma ideia simplificada de como funciona o sistema. Além da plataforma, do marketing digital, é importante contar com uma estratégia para entrar no mercado e definir como falar com os clientes, por exemplo, saber como treinar os vendedores e os RCAs.”
Schoppen também informou que é possível implantar um site simples, entre 30 mil reais e 50 mil reais. Mas, se o objetivo é desenvolver um canal, o que equivale a um marketplace, como um mercado livre de B&B, é preciso pensar em milhões de investimentos. 

Quem já está familiarizado com tecnologia, sem necessariamente ser um expert no assunto, pode adotar soluções mais econômicas para implantar o seu site de vendas. “Existem soluções de tecnologia. O atacado precisa ter as ferramentas necessárias para expor seu estoque, receber pedidos e faturar, como faz no mundo off-line. Precisa de um sistema atualizado, com uma ou duas pessoas operando constantemente, ser rápido para disponibilizar o pedido e ser rápido na entrega” explica Fábio Mori, sócio e diretor-executivo da Tatix, especialista no gerenciamento e na operação de lojas virtuais.

Mori considera fundamental a empresa ter o monitoramento permanente, para se manter no jogo de vendas virtuais, que tem suas regras e seu formato. “É importante atuar com clareza e não ferir a cadeia de distribuição. As boas plataformas de vendas demonstram eficiência no cumprimento dos prazos, nos preços e no conteúdo, e estão atentas aos interesses demonstrados pelos clientes. Elas vivem de audiência.” 

A empresa SP Logística atua no segmento de logística, em especial para o varejo em geral e se especializou em trabalhar com e-commerce, já que o número de varejistas trabalhando com e-commerce já é considerável no País. Segundo Natálkia Brizze, coordenadora da área na empresa, em todos os setores da logística disponibilizada, a integração e a aplicação maciça de tecnologia viabilizam a movimentação de pequenos e grandes volumes, independentemente de sua complexidade”, informa. 

Alguns dos pontos positivos da empresa é o seu centro de distribuição amplo com fácil acesso às principais rodovias como Castelo Branco, Rodoanel e Raposo Tavares, sistema de operação de pickings automatizados, Sorter com sete rampas, capacidade de separação de 2.800 volumes/hora via Sorter. “ O nosso trabalho oferece segurança total, box customizado, sistema de roteirização Road Net, capacidade de separação de 1200 pedidos hora com 7 mil picking light, frota terceirizada e entrega porta a porta”, enfatiza Natália.

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