ENTREVISTA ALAIR MARTINS

Olhos voltados para o futuro

Com 89 anos, Alair Martins, se mostra jovem em seu raciocínio e mantém os seus ideais e objetivos com a mesma garra que iniciou no atacado há 70 anos

por Claudia Rivoiro

Um dos pioneiros no atacado brasileiro, Alair Martins, fundou o grupo que leva o seu sobrenome há sete décadas em Uberlândia/MG. De lá para cá, muito trabalho e pioneirismo em várias ações como contratar um CEO para administrar o dia a dia, possuir um banco para auxiliar os seus clientes, abrir o seu e-commerce há mais de 20 anos, abordar sustentabilidade quando ainda ninguém sabia o que era e o que viria a ser, e muito mais, como a abertura da Universidade do Varejo. Em entrevista exclusiva à DISTRIBUIÇÃO, o empresário, que se tornou ícone do setor, ressalta que se deve aprender com o passado, mas ter os olhos voltados para o que vem pela frente.

O senhor fundou o Grupo Martins há 70 anos.Qual a sua maior missão?

Essa pergunta me faz lembrar que devemos aprender com o passado, mas ter os olhos sempre voltados para o futuro. Evoluir é primordial. Por isso sempre digo que “não há nada tão bom que não possa ser melhorado”. Temos obsessão pela evolução e pelo aperfeiçoamento de nosso modo de fazer as coisas.Por isso é que um dos valores do Martins é a “Inovação”, sempre. Procuro fazer desse valor uma obsessão e conscientizar nossa organização de que devemos olhar sempre para a frente e nunca ter medo de arriscar. Essa sempre será a minha missão:servir de apoio e inspiração para a evolução constante. Nossa equipe é exemplar.  Vocês podem pensar: “… como pode um homem de 89 anos falar ainda de futuro e de evolução…”. Mas um obstinado como eu nunca deixa de sonhar e desenhar objetivos para o futuro. Foram sete décadas de trabalho sério em que me dediquei de coração a esta causa chamada Martins, que hoje é meu orgulho.

O senhor sempre falou  e pregou o custo de servir. Ainda é válido?

Mais que falar, procurei praticar e compartilhar a iniciativa de servir. Defendo a excelência de relações onde exista excesso de qualidade, em qualquer nível de relacionamento, sejam amigos, clientes, fornecedores ou parceiros de toda ordem. Vou dar somente um exemplo que pautou a trajetória do Martins se encaixa nessa filosofia: ao exercer nosso trabalho descobrimos a imensa necessidade dos pequenos e médios varejistas do país em relação à gestão técnica e profissional do negócio e na formação de mão-de-obra. Então criamos a Universidade Martins do Varejo, destinada a oferecer formação e treinamento para o cliente e seus funcionários em todas as atividades do negócio, além de tecnologia e apoio. Também dentro desse objetivo aderimos aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU, que incentivam as organizações a assumirem ações concretas de cunho social, ambiental e de governança.

E criamos a ESG Martins, com um compromisso assumido publicamente de consolidar um modelo de negócio sustentável que contribua efetivamente para o pequeno e médio varejista brasileiro prosperar, gerar valor e impacto positivo nas comunidades onde atuam. Outra iniciativa nossa que merece destaque é o Instituto Alair Martins, o nosso IAMAR. Ele é o que chamamos de “braço social” do Sistema Martins, uma instituição de natureza educacional, socioambiental e cultural constituída sob a forma de associação civil, sem fins econômicos e lucrativos. Desde sua criação, o IAMAR já atendeu diretamente mais de 100 mil jovens com projetos próprios e beneficiou milhões de pessoas através do apoio a organizações parceiras.

O senhor se tornou um ícone do canal indireto. Vê  como um peso ou  envaidecido?

 Acredito que a realidade brasileira, com essa dimensão continental e todas as carências possíveis, impôs necessidades enormes ao comércio. As dificuldades sempre foram enormes, mas nunca desistimos. Perdoem a falta de modéstia, mas houve uma época em que fomos verdadeiros heróis do abastecimento em determinadas regiões, porque somente o Martins chegava nesses locais. Mais do que um trabalho, foi dedicação a uma causa. A infraestrutura melhorou, mas as distâncias e os desafios continuam a testar nossa capacidade e nossa criatividade.

De algum tempo para cá, muitos dos atacados de entrega têm se tornado multicanal. Como analisa esse movimento? 

Considero quase uma tendência. Mas acho que este é um fenômeno que ocorre nas regiões urbanas. O atacado-distribuidor, que é o nosso negócio, continua com seu desempenho satisfatório no desafio das distâncias, e somente organizações como a nossa estão estruturadas para realizar esse trabalho num país dessa dimensão. Porém, estamos extremamente bem preparados para diversificar ainda mais nossos canais.

Quais os números atuais do Grupo Martins? Entrevistamos o senhor em 2013, quando a companhia comemorava 60 anos. O que mudou? 

Muita coisa mudou, como não poderia deixar de ser, porque tudo evolui. Como inovadores, procuramos sempre ficar à frente das tendências e estamos conseguindo nos superar. A pandemia, que praticamente parou o país, nunca freou nosso trabalho, e os resultados alcançados nesse período, com todos os obstáculos, comprovam que nada segura a determinação de trabalhar sério. Nossos caminhões não pararam de circular e considero que fomos responsáveis por derrotar a ameaça de desabastecimento em muitas regiões do país. 

O Grupo Martins foi pioneiro em contratar um CEO. Como foi essa experiência ? 

Muito satisfatória. Esse sinal foi dado por mim no início da década de 1970, quando estava ficando muito concentrador e decidi delegar poderes a nível de gerências a fim de que a empresa pudesse crescer. E hoje é assim: os acionistas não podem ter funções operacionais e devem ser preservados para que possam gerir a inteligência da organização. Assim nos estruturamos com um Conselho de Administração, a quem o CEO responde, e desse Conselho saem as diretrizes e estratégias a serem implementadas. O Conselho de Administração é composto pelos meus três filhos, que são os acionistas, e mais quatro conselheiros externos, sendo um deles presidente do Conselho. Sou o presidente honorário e participo de todas as questões tratadas pelo Conselho.

 Conte-nos a sua contribuição e dos demais familiares no Grupo. 

Meus filhos Renato, Juscelino e Alair Jr. são os acionistas. No Acordo de Sucessão que fizemos, doei todas as ações para os três filhos, igualitariamente, e mantenho o controle até que não esteja mais aqui ou que decida de alguma forma interromper minha participação. Faço parte das decisões e sempre dou meus conselhos e minha opinião, mas considero que eles estão muito bem preparados para fazer nossa organização evoluir e continuar o trabalho maravilhoso que vem executando há 70 anos.

 Finalizando, o que a empresa representa para o senhor? 

Sempre digo que tenho quatro filhos: Renato, Juscelino, Alair Jr. e o Martins. E vocês devem notar que se transformou em cultura dentro da empresa o fato de que nós todos nos referimos à nossa organização como “o” Martins, e não, como seria mais correto, para a concordância de gênero, “a” empresa Martins. Sou um homem realizado. Tenho orgulho da família que formei juntamente com a minha mulher, Wanda. Renato, Juscelino e Alair Júnior me deram os melhores netos, e até um bisneto, que alguém pode querer. E “o” Martins, meu outro filho querido, me deu a oportunidade de fazer da minha vida a realização de um sonho de criança, que era apenas ser do bem e agir sempre da melhor forma possível, dentro dos princípios e valores ensinados por meus pais, que conservo até hoje. Ao Martins me entreguei de coração e fui integralmente correspondido. Considero que posso ser classificado na categoria dos vencedores.

DB DigitalReceba no seu email

DB DigitalReceba no seu email