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Inovação nos canais

As relações comerciais se potencializam e seguem a cartilha de investir em sistemas, integrados ou não, para melhorar a experiência de compra e os serviços

Por Rúbia Evangelinellis

Já vai longe o tempo em que as empresas determinavam o que iriam oferecer aos clientes. Mas, no atual mundo conectado, ágil e no qual as escolhas de compras e a velocidade de obtenção das informações são consideradas diferenciais nas relações comerciais e no atendimento ao consumidor, dois conceitos entram para valer no vocabulário das empresas: omnichannel e multicanalidade.

Omnichannel, ou omnicanalidade, significa integração dos canais de vendas e de atendimento físicos e digitais com sinergia e compartilhamento de informações com vistas a melhorar a experiência de compra. Por sua vez, a multicanalidade conserva certa reserva, com cada canal ligado mantendo o foco no seu atendimento e na sua comercialização. Esses muitos canais caminham juntos, mas sem que haja uma única plataforma de atendimento e vendas. Em outras palavras, elas são capazes de dinamizar um plano de expansão de um grupo ou empresa e se comunicam com seus clientes, mas cada qual mantém seu espaço.

Paulo Resende, coordenador  do Núcleo de Infraestrutura, Logística e Supply Chain da Fundação Dom Cabral, ressalta o que considera um dos mais importantes fenômenos recentes que ocorrem nas indústrias  no  capitalismo mundial: o deslocamento do poder para as mãos dos detentores do consumo e dos transformadores  da produção.  

A criação de uma rede mundial de informações e o avanço da tecnologia, recorda, empoderou o consumidor e mudou a relação de oferta que existia até então no mercado, orquestrada pela linha de produção, pela economia em escala e pelo sortimento restrito de produtos. “Com um computador pessoal e a internet, os consumidores passaram a perceber que poderiam ter acesso a produtos adequados a seu gosto sem ter de sair de casa para comprar o que é oferecido na loja. Imagine isso em escala infinita, considerando todos os produtos e serviços. Com isso, o que aconteceu foi o deslocamento de poder da linha de produção para o consumidor”, explica. 

O protagonismo concedido ao consumidor final, acrescenta, significou a reavaliação dos processos e estratégias para atendê-lo onde ele estiver, e na forma, na quantidade e no formato que quiser. “Se a indústria, o operador logístico e outros elos da cadeia produtiva recebem choques, efeitos de onda de uma demanda cada vez mais complexa, uma das maneiras de satisfazer é ter multicanais de vendas e de distribuição”, destaca.

Resende também alerta para o fato de que a multicanalidade não deve ser considerada como operação de redução de custos, mas sim como conceito de aproximação maior para quem define a demanda. “Ele carrega consigo a ideia de aproximação, e é mais caro e complexo, inclusive na distribuição. Mas existe porque é uma exigência da ponta consumidora”, diz, ressaltando o desafio de implantar a operação no Brasil, país de extensão continental, com desigualdades “enormes” e no qual é intensa a influência das necessidades de  consumo regional.

Nesse xadrez em que cada movimento de peças deve ser estudado, mesmo que seja para evitar o estrangulamento de alguma operação, é preciso considerar duas estratégias: conhecer, efetivamente, o que é valor para o cliente (desde as ações sociais até as comerciais e de consumo) e verificar se a empresa pode realizar sozinha toda a operação; e também, se necessário, buscar parcerias para implantar o sistema sem que isso leve a um aumento de custos operacionais e à destruição de margem.

Em relação à implantação da omnichannel, que envolve a integração plena entre todos os canais de vendas e de informação (omni significa “todos” ou “tudo”), a empresa, para manter essa operação, precisa ser robusta, realizar o sincronismo dos processos, não confundir os clientes e entender como a demanda funciona em cada canal. “A empresa precisa ter maturidade”, resume Resende.

Um passo à frente

José Sarkis Arakelian, professor de Estratégia de Marketing na FAAP – Fundação Armando Alvares Penteado, concorda com o fato de que se trata de dar um passo à frente, apesar de essa atitude remeter a mais cuidados e de nem todas as empresas estarem preparadas para implantar o sistema. “Em um efetivo omnichannel, a centralidade do consumidor é atributo inegociável para o sucesso. A comunicação pode migrar, e de fato migra constantemente, entre os canais, e a fluidez é sua dinâmica  fundamental.”

O especialista destaca a importância de levar em consideração a característica de cada canal para que o “todo” da comunicação aconteça sem interrupções ou falhas. “O ruído nessa jornada de compra tem um impacto ainda maior do que na multicanalidade.”

A partir desse processo é possível em uma mesma jornada fazer a pesquisa pelo Twitter, comprar na loja e receber em casa. Esse sistema exige uma plataforma, fio condutor ou interface para a integração entre os canais, e corresponde a uma evolução quando comparada a um processo restrito à multicanalidade, que pode ser considerada parte integrante de um conceito maior, no caso, o omnichannel,  avalia. 

Mais recursos

Ricardo Pastore, professor e coordenador do Núcleo de Varejo e Retail Lab da ESPM-SP – Escola Superior de Propaganda e Marketing de São Paulo, indica o crescimento dos meios de relações de vendas B&B nos últimos anos. “Um relatório da McKinsey (consultoria internacional) mostra que em 2016 o relacionamento envolvia cinco canais e meio, como visita pessoal, telefone e e-mail. Mas, durante a pandemia, no fim de 2021, o número desses meios de comunicação duplicou, chegando a dez, e acredito que vai crescer ainda mais. Na medida em que a tecnologia avança, torna o uso das ferramentas mais simples e acessível, ou seja, as duas pontas passam a ter mais recursos para utilizar.”

A multicanalidade, a seu ver, inova e traz mudança no modelo de negócios, reduzindo processos. Deixa de ser uma relação de apenas compra e venda entre as empresas e passa a ser uma prestação de serviços, considerando inclusive o fato de uma expor o produto da outra e, quando a venda for efetivamente acertada, de se pagar o produto e a comissão, provocando mais sinergia entre as parcerias.

A inovação é justificada pelos ganhos de ambas as partes, como a redução de tempo e de custos, e o aumento da presença em diversos canais e pontos de venda. “É uma série de benefícios que justificam o investimento em tecnologia”, observa Pastore.

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