Matéria de Capa

Sabor de retomada

Apesar da retomada do seu crescimento, e da potencialidade para um desenvolvimento ainda maior, o food service ainda inspira cuidados, bem como o apoio de distribuidores

Por Rúbia Evangelinellis

O setor de food service respira mais aliviado e experimenta o sabor da retomada. Apesar de a forte tempestade ter ficado para trás, quando restaurantes, bares e outros estabelecimentos tiveram de fechar suas portas e encontrar no delivery o caminho para reduzir o impacto da queda no consumo, os distribuidores reconhecem que o momento ainda é de luta para enfrentar desafios e corrigir rumos, tomando como base as lições aprendidas. Entre elas está a capacidade para fortalecer as alianças e ajudar na melhoria da gestão dos negócios dos operadores.  

Com 14 empresas integrantes, 13 delas cobrindo 80% do território nacional e uma presente no Chile, o Grupo Diefs – Distribuidores Especializados em Food Service fez valer a força da união para superar os momentos difíceis da pandemia, quando tiveram, simultaneamente, de estender a mão aos clientes e encontrar saídas para driblar a crise. “A pandemia nos fortaleceu, como Grupo, as conexões entre nós e com os demais elos da cadeia. Principalmente em março, abril e maio de 2020, buscamos aprofundar a troca de experiências e informações. Foi o período de maior sufoco dos negócios. Passamos, no Grupo, a elaborar um megarrelatório gerencial, e compartilhamos soluções e problemas. Comunicamos a situação à indústria e pedimos o apoio dos fornecedores, até mesmo para auxiliar os clientes”, explica Flávia Carro, coordenadora. 

A dura necessidade de se adotar medidas restritivas e de isolamento, acrescenta, exigiu mudanças no sistema operacional tanto dos estabelecimentos de food service, que resistiram à fase hard – quando tiveram de permanecer com as portas fechadas – como dos distribuidores que os atendem. Mas também foi um período de aprendizado, de avanço de vendas por meio de delivery dos operadores, de rever a carteira de clientes e de buscar novas alternativas para vender. 

A partir de então, segundo Flávia, a consultoria dos distribuidores aos clientes se fortaleceu, bem como o compartilhamento detalhado de informações. “Estreitamos o nosso relacionamento com os operadores/clientes para melhor entendermos suas carências. E sabemos que muitos se consideram animados por uma missão solitária. São pessoas que abrem um estabelecimento com o dinheiro de uma rescisão de contrato de trabalho ou do FGTS, ou que  herdaram uma padaria, restaurante, pizzaria, etc. e carecem de apoio. Os distribuidores foram além da iniciativa de ajudá-los financeiramente, aumentando o parcelamento de compra. Colaboraram até mesmo para a implantação do delivery e em outros pontos da operação”, explica. 

Mas a crise atuou também como um período de aprendizado e de fortalecimento das alianças com saldo positivo. Tanto que o Grupo Diefs prevê que ocorrerá um aumento de 15,8% no faturamento de 2022 em comparação com o do ano passado, o qual totalizou 2,5 bilhões de reais. Embora atuem de maneira alinhada, cada integrante respeita o DNA da sua região, o que permite uma resposta mais assertiva e rápida aos problemas detectados dos clientes, observa Flávia ao avaliar o crescimento. “No acumulado de janeiro a julho de 2022, aumentamos os negócios em 96% em comparação com o mesmo período de 2019. Isso resulta de um trabalho feito ponto a ponto, de atuação regional dos distribuidores, de atendimento personalizado para entender a necessidade de cada operador e da aliança com clientes e indústria”, destaca, acrescentando que em julho foram apurados 85 mil clientes ativos.

Uma vez plantada a semente da consultoria, os Diefs buscaram apoio do Sebrae – Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas para capacitar bares, restaurantes, padarias e outros estabelecimentos que atuam no ramo com um curso gratuito de gestão, contanto que sejam enquadrados como micro ou pequena empresa. O Programa Brasil Mais, como é identificado, tem o propósito de aumentar a competitividade do negócio por meio de consultoria pelos agentes de inovação. São avaliados pontos de gestão em diversas áreas, como financeira, de desempenho, de operações de vendas, de capital humano, de produtos e de transformação digital e de produção. 

Solidez financeira

Com atuação no Rio de Janeiro e com 97% dos clientes oriundos do food service, a distribuidora Rio Quality, parte integrante do Grupo Diefs, já indicou 150 clientes para a mentoria. Marcello Marinho, gerente de Planejamento, entende que a fase crítica passou, mas o momento ainda é de desafios. “Queremos levar conhecimento aos clientes. Hoje, o setor já respira, mas os estabelecimentos continuam com dificuldades. A grande maioria dos bares e restaurantes ainda está endividada. E além disso, temos a inflação, que corrói o poder de compra da população, encarece os preços nos supermercados e limita o poder de gasto no food service.” 

Marinho explica que a empresa mantém ativa a ajuda aos clientes, parcelando em torno de 20 dias, mas em uma escala menor que a oferecida no início da pandemia, quando a conta chegou a ser dividida em 12 vezes. Ele recorda que as medidas restritivas de combate à Covid pegou a empresa em um momento de crescimento de negócios. “Estávamos em uma fase de expansão da base de clientes oferecendo um mix completo de maior sortimento, composto por mercearia seca, resfriados, congelados e linha de bebidas alcoólicas, mas também  mantendo o foco em padarias. Quando passou a vigorar a primeira semana de ‘lockdown’(a terceira de março), as vendas caíram em 90%”, lembrou.

Ainda assim, acrescenta, a empresa conseguiu encerrar março de 2020 com um resultado positivo, de 20 milhões de reais, mas abaixo da expectativa, de 26 milhões de reais.  Mas em abril de 2020, o baque da queda foi plenamente sentido, com as vendas retraindo em 50% e o número de clientes despencando para 4.000. “Montamos um comitê de guerra, que funcionou muito bem, e conseguimos em junho recuperar o faturamento, que totalizou 18,5 milhões de reais. Em julho, alcançamos o resultado de 24 milhões de reais, o mesmo montante de janeiro. Em agosto, quando ocorreu a flexibilização, conseguimos recuperar a base de clientes, subindo para 8 mil, e registrando recorde de faturamento”, explica. 

Marinho atribui a rápida recuperação às ações de fortalecimento dos negócios, adotados antes da pandemia e durante seu impacto, como a de oferecer um mix completo, que passou de mil a 1.800 itens, e a de revisar a “máquina” de vendas, aprimorando a gestão oferecida aos clientes e captando novos, além da reação rápida do comitê. Outro ponto que contribuiu positivamente foi o fato de a empresa, por estar capitalizada, ter solidez financeira, o que garantiu a manutenção dos empregos, a ajuda aos clientes (alongando o prazo de parcelamento em até 12 meses) e a melhor negociação com a indústria, com as possibilidades de pagar à vista e de quitar, por antecipação, os boletos. 

Apesar dos solavancos, a Rio Quality fechou 2020 com um crescimento do faturamento de 20%, e conquistou, em 2021, outro salto positivo, de 50%. Em 2022, a empresa prevê que seu faturamento aumentará entre 30% e 35%, aprofundando o sortimento e a consultoria aos clientes, bem como ampliando a base atendida. “Temos gastrônomos profissionais no time comercial, e conectamos indústrias com os clientes para levar ações promocionais aos estabelecimentos.”

Turismo e fast food

Reinventar o negócio, acelerar os projetos de vendas via delivery dos estabelecimentos e ter fôlego para superar a fase difícil até chegar, hoje, a um panorama mais favorável de negócios. É assim que Flávio Barros, diretor-comercial da KarneKeijo Food Service, que representa 40% do negócio do Grupo (outros 60% vêm de lojas do varejo e de autosserviço) resume a dinâmica experimentada pelo setor a partir de 2020. A distribuidora abastece diretamente 5.800 restaurantes, hotéis, hospitais, lojas de conveniência, refeitórios industriais e outros estabelecimentos do segmento instalados em Sergipe, Alagoas, Pernambuco, Paraíba e Rio Grande do Norte. Conta com um portfólio de 3 mil itens, que incluem mercearia seca, alimentos frigorificados e itens diversos. 

Como atende estabelecimentos localizados em Estados que atraem turistas, registram, por isso, um maior movimento de pedidos. Apesar do aquecimento, a distribuidora ainda precisa estender a mão aos clientes, oferecendo-lhes prazos de pagamento mais longos, uma vez que houve aumento do número de vendas via delivery, pagas com cartão. 

Pelas suas contas, 30% a 40% do faturamento dos clientes vêm atualmente do delivery, fato que apresenta uma nova configuração em termos de canais de vendas. Isso fez com que a KarneKeijo também reconhecesse nisso uma nova frente de vendas. Atualmente, mantém uma equipe de 32 colaboradores monitorando as plataformas para capturar novos clientes. 

Outras mudanças ocorridas a partir da pandemia foram a reformulação de cardápios e o surgimento de uma nova faixa de consumo, entre 17 e 19 horas. Atenta a esses movimentos, a KarneKeijo também oferece apoio de consultores gastronômicos para a elaboração de menus mais econômicos. “Os clientes pedem novidades para baratear o custo dos pratos e que tragam praticidade e velocidade para o preparo das receitas”, explica. A meta é chegar a um incremento de 30% em food service e impulsionar o Grupo, que projeta um faturamento de um bilhão de reais, com alta de 17%.  

Além de atender diretamente os clientes de food service e o autosserviço (com três lojas Descontão no Recife), a empresa também investe no seu e-commerce B&B, com a operação iniciada por Recife. A empresa prevê estender até novembro sua operação aos demais Estados em que atua, e se empenha  para que o canal digital represente 5% do faturamento em 2023. A KarneKeijo também possui três balcões de negócios – em Pernambuco (Recife), Paraíba e Rio Grande do Norte –, que prestam atendimento no atacado.

A KarneKeijo prevê aumentar em 30% seu faturamento em 2022, contando com o estímulo de eventos festivos, como a Copa do Mundo, a confraternização de fim de ano e o maior movimento de turistas na região. “Hoje, no Recife, há vários hotéis que estão  quase 100% reservados no Carnaval.”

Visão diferente

A Playvender Distribuidora permanece atenta e mantém o olhar vigilante ao setor de food service desde 2019, ano em que adquiriu essa linha de negócios do Grupo Zamboni. Cláudio Campos, presidente e fundador do Grupo, explica que ainda se trata de uma divisão pouco representativa no faturamento do grupo, mas com potencial de expansão: “Acreditamos que será um dos pilares importantes nos nossos planos de crescimento.  O período pós-covid nos trouxe uma visão diferente para esse mercado. Conseguimos perceber sua importância em qualquer cenário e acredito que seja o que mais evoluiu no aprendizado que a pandemia nos proporcionou.”

A Playvender prevê que a divisão representará 10% do faturamento em 2023, um impulso que será proporcionado com o lançamento das linhas de resfriados e congelados, ocorridas na segunda quinzena de agosto. O fato é que a food service já entrega, segundo Campos, um incremento de 40% no acumulado do ano. Para o empresário, a pandemia “amadureceu muito” a cadeia de abastecimento, especialmente para o auxílio prestado aos bares, restaurantes e outros locais que permaneceram fechados. 

“Desempenhamos um papel importante ao apoiar os clientes para superar essa fase, mas, infelizmente, muitos não suportaram e faliram, trazendo também perdas para a nossa operação. Mas acreditamos que a pandemia está superada e já percebemos muitas lojas reabrindo com novos proprietários. Como somos uma empresa desafiante para esse canal, apostamos no empoderamento dos distribuidores que tenham uma opção completa de portfólio”, destaca, acrescentando a importância de também oferecer excelência no serviço prestado. 

No plano de investimentos da Playvender, 40 milhões estão destinados à operação de alavancagem da divisão. Atualmente, o grupo conta com 8 mil clientes nessa divisão, presentes no Rio de Janeiro, para os quais disponibiliza um mix de 4 mil itens. Mas os planos em estudo pretendem atravessar fronteiras, ampliando o mapa de negócios para Minas Gerais e o Espírito Santo nos próximos anos. 

Atuação nacional

Com vigorosa atuação no nível nacional, o grupo Delly’s Food Service entende que o mercado mostrou resiliência a partir da pandemia. “Os estabelecimentos se reinventaram, lançando mão do delivery (na pior fase). Acreditamos que agora o setor está em recuperação e deverá crescer nos próximos anos, além do fato de que inclui muitos atrativos”, observa Alessandro Chiaramitara, presidente do Conselho da empresa.

Alessandro Chiaramitara, presidente do Conselho da Delly’s

Segundo informou, a Delly’s aposta nesse ramo de atividade desde 2014, e reafirma os planos de investimentos em novos centros de distribuição e em tecnologia. Atualmente, conta com um portfólio com 25 mil itens e 250 mil clientes, e opera com o conceito one stop shop, o mesmo de encontrar tudo em um único lugar. “Trabalhamos com esse conceito para oferecer soluções ao cliente, sejam elas um restaurante, um hotel ou outro estabelecimento, que possa encontrar 100% do que precisa conosco. E completamos o atendimento com a entrega em 24 horas”, observa.

 O food service representa 70% do faturamento do Grupo, que também atende o pequeno varejo. Alessandro explica que toda a estratégia da operação está focada em vencer juntamente com os clientes, e encontrar soluções em que os dois lados ganhem, seja com oferta de crédito, de portfólio adequado (mais competitivo de custo) e de treinamento. “Temos, inclusive, uma academia culinária que orienta a respeito de como utilizar melhor os produtos, reduzir o desperdício, e aumentar a performance no preparo da refeição. Damos cursos gratuitos de aprimoramento profissional, por exemplo, para padeiros e pizzaiolos. Precisamos auxiliar os clientes a encontrar soluções adaptadas ao momento em que estão vivendo, para o cardápio e a compra. Temos em linha até carne fracionada, e vendemos por telefone, site, na loja e pelo vendedor externo. Atuamos com a omnicanalidade, onde o comprador consegue até mesmo rastrear o seu pedido. Desse modo, simplificamos e facilitamos a operação de compra.”

Para este ano, que se apresenta com resultados positivos, nossa meta é alcançar 5 bilhões de reais de faturamento para o Grupo, acima de 20% dos obtidos em 2021. O food service deve impulsionar o crescimento, com expansão de novas regiões do Centro-Oeste , do Nordeste e do Norte. “Temos uma crença muito sólida no setor, tanto que mantivemos o investimento até mesmo durante a pandemia. Hoje, estamos colhendo os frutos e estamos focados em impulsionar a digitalização e o serviço ao cliente, onde entra a intenção de  manter 20 centros de distribuição e 20 pontos avançados de abastecimento.”

DB DigitalReceba no seu email

DB DigitalReceba no seu email